quinta-feira, 25 de junho de 2009

Para quem quer aprender a gostar

Para quem quer aprender a gostar

Artur da Távola

Talvez seja tão simples, tolo e natural, que você nunca tenha parado para pensar: aprende a fazer bonito o seu amor! Ou fazer o seu amor ser ou ficar bonito. Aprenda, apenas, a tão difícil arte de amar bonito. Gostar é tão fácil que ninguém aceita aprender.

Tenho visto muito amor por aí. Amores mesmo, bravios, gigantescos, descomunais, profundos, sinceros, cheios de en­trega, doação e dádiva. Mas esbarram na dificuldade de se tor­narem bonitos. Apenas isso: bonitos, belos ou embelezados, tratados com carinho, cuidado e atenção. Amores levados com arte e ternura de mãos jardineiras.

Aí, esses amores que são verdadeiros, eternos e descomu­nais, de repente se percebem ameaçados apenas e tão-somente porque não sabem ser bonitos: cobram; exigem; rotinizam; descuidam; reclamam; deixam de compreender; necessitam mais do que oferecem; precisam mais do que atendem; en­chem-se de razões. Sim, de razões. Ter razão é o maior perigo no amor. Quem tem razão sempre se sente no direito (e o tem) de reivindicar, de exigir justiça, equidade, equiparação, sem atinar que o que está sem razão talvez passe por um mo­mento de sua vida no qual não possa ter razão. Nem queira.

Ter razão é um perigo: em geral enfeia o amor, pois é invo­cado com justiça, mas na hora errada. Amar bonito é saber a hora de ter razão.

Ponha a mão na consciência. Você tem certeza de que está fazendo o seu amor bonito? De que está tirando do gesto, da ação, da reação, do olhar, da saudade, da alegria do encon­tro, da dor do desencontro, a maior beleza possível? Talvez não. Cheio ou cheia de razões, você espera do amor apenas aquilo que é exigido por suas partes necessitadas, quando tal­vez dele devesse pouco esperar, para valorizar melhor tudo de bom que de vez em quando ele pode trazer. Quem espera mais do que isso sofre e, sofrendo, deixa de amar bonito. So­frendo, deixa de ser alegre, igual, irmão, criança. E sem soltar a criança, nenhum amor é bonito.

Não tema o romantismo. Derrube as cercas da opinião alheia. Faça coroas de margaridas e enfeite a cabeça de quem você ama. Saia cantando e olhe alegre. Recomendam-se enca­bulamentos; ser flagrado gostando; não se cansar de olhar, e olhar; não atrapalhar a convivência com teorizações; adiar sempre, se possível com beijos, “aquela conversa importante que precisamos ter”; arquivar as reclamações pela pouca aten­ção recebida. Para quem ama, toda atenção é sempre pouca. Quem ama feio não sabe que pouca atenção pode ser toda a atenção possível. Quem ama bonito, não gasta o tempo dessa atenção cobrando a que deixou de ter.

Não teorize sobre o amor (deixe isso para nós, pobres escri­tores que vemos a vida como a criança de nariz encostado na vitrina cheia de brinquedos dos nossos sonhos). Apenas ame. Siga o destino dos sentimentos aqui e agora.

Não tenha medo exatamente de tudo que você teme, como: a sinceridade; não dar certo; depois vir a sofrer (sofrerá de qualquer jeito); abrir o coração; contar a verdade do tama­nho do amor que sente.

Jogue pro alto todas as jogadas, estratagemas, golpes, esper­tezas, atitudes sabidamente eficazes (não é sábio ser sabido); seja apenas você no auge de sua emoção e carência, exatamente aquele você que a vida impede de ser. Seja você cantando desafinado, mas todas as manhãs. Falando besteira, mas criando sempre. Gaguejando flores. Sentindo o coração bater como no tempo do Natal infantil, revivendo os carinhos que intuiu em criança. Sem medo de dizer eu quero, eu gosto, eu estou com vontade.

Talvez aí você consiga fazer o seu amor bonito, ou fazer bonito o seu amor, ou bonitar fazendo amor, ou amar fazendo o seu amor bonito, sempre que ele seja a verdadeira expressão de tudo o que você é e nunca conseguiu, soube, pôde ou foi possível ser.

Se o amor existe, seu conteúdo já é manifesto. Não se preo­cupe com ele e suas definições. Cuide agora da forma. Cuide da voz. Cuide da fala. Cuide do cuidado. Cuide do carinho. Cuide de você. Ame-se o suficiente para ser capaz de gostar do amor e, só assim, poder fazer o outro feliz.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Tesouro brasileiro na internet
Autor: Fábio de Castro. Data: 18/6/2009.

Fonte:
http://www.agencia.fapesp.br/materia/10650/tesouro-brasileiro-na-internet.htm#

Agência FAPESP - Foi lançado oficialmente, na última terça-feira (16/6), o
projeto Brasiliana Digital, que disponibilizará pela internet, com acesso
livre, a coleção de cerca de 40 mil volumes da Biblioteca Guita e José
Mindlin, doada à Universidade de São Paulo (USP) em 2006, além de outros
acervos da USP. A versão inicial, que já está funcionando, oferece acesso a 3 mil documentos
da coleção reunida por Mindlin ao longo de mais de 80 anos. O lançamento do
projeto, realizado em conjunto com uma homenagem ao bibliófilo, ocorreu
durante a cerimônia de abertura do seminário Livros, Leituras e Novas
Tecnologias, no Museu de Arte de São Paulo (Masp), na capital paulista.

"Desde que comecei a coleção, já sabia que a biblioteca não podia ser para
sempre um patrimônio particular. Estava claro que éramos depositários e
formadores desse conjunto, mas sem o viés da propriedade. Como toda minha
família tem forte relação com a USP desde a década de 1930, quando entrei no
curso de Direito da universidade recém-inaugurada, não tive dúvidas sobre a
escolha da instituição para a qual deveria doar esse patrimônio", disse
Mindlin.
A fase piloto de implantação do projeto conta com apoio da FAPESP, por meio

da modalidade Auxílio a Pesquisa - Regular. Os recursos fornecidos pela
Fundação permitiram a compra de um sistema integrado de digitalização
robotizada de livros encadernados.

"O robô foi adquirido em janeiro e neste primeiro semestre parte da nossa

equipe foi para os Estados Unidos receber treinamento para operá-lo. Há sete
semanas estamos trabalhando com ele. O robô permite digitalizar cerca de 2,4
mil páginas por hora, o que equivale a cerca de 40 livros por dia", disse
Pedro Puntoni, professor do Departamento de História da USP e coordenador da
Brasiliana Digital, à Agência FAPESP.A Biblioteca Guita e José Mindlin reúne diversos tipos de livros, folhetos e manuscritos sobre assuntos brasileiros. "O acervo cobre áreas como
literatura, prosa e poesia, história, relatos de viagens, crítica literária,
ensaios, filologia, dicionários, obras de cronistas, história natural,
botânica e zoologia. Nem tudo está em português, mas tudo diz respeito ao
Brasil", explicou Puntoni. Segundo ele, o projeto permitirá aliar a conservação das obras - muitas
delas com vários séculos de existência - e a universalização do acesso a
elas. "O governo brasileiro, em suas três esferas, tem investido muito em
inclusão digital, que deverá aumentar imensamente a parcela da população
brasileira com acesso à internet. A Brasiliana Digital dará acesso a esse
acervo riquíssimo, preservando-o ao mesmo tempo", afirmou. O historiador explicou que ainda não há previsão do tempo necessário para a digitalização integral do acervo doado por Mindlin. Mas, com a tecnologia de digitalização avançada e um sistema de gestão de informação adequado, a
equipe está pronta para ampliar o ritmo do projeto.

"Como o prédio no qual o acervo será instalado ainda não está pronto, não
pudemos ainda definir a dinâmica do processo. O robô, apelidado pela equipe
de Maria Bonita, é operado por conservadores. Quando lidamos com um livro do
século 16, por exemplo, temos que diminuir o ritmo. Estamos ainda aprendendo
a lidar com o equipamento", disse.

O projeto recebeu da FAPESP até o momento cerca de US$ 980 mil, usados para
a compra do robô e apoio a 15 bolsistas. Segundo Puntoni, a equipe envolvida
com o projeto tem cerca de 30 integrantes, entre pesquisadores,
bibliotecários, analistas e programadores.

A base do projeto Brasiliana Digital, segundo Puntoni, é o projeto
Brasiliana USP, coordenado por István Jancsó, do Instituto de Estudos
Brasileiros (IEB) da USP. "A Brasiliana USP é um projeto da reitoria da USP
que permitirá o acesso para pesquisa e ensino da maior coleção de livros e
documentos de e sobre o Brasil custodiada por uma universidade em escala
mundial, tornando-a disponível na internet", explicou Puntoni.

Para abrigar o acervo doado por Mindlin e a nova sede do IEB, a Brasiliana
USP está construindo um edifício com cerca de 20 mil metros quadrados no
centro da Cidade Universitária, em São Paulo. O projeto foi desenvolvido
pelos arquitetos Eduardo de Almeida e Rodrigo Mindlin Loeb, com a assessoria
da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP.

"O contrato com a construtora prevê o prédio pronto no fim de outubro,
incluindo toda a parte estrutural, como ar-condicionado, cadeiras do
auditório, elevadores, etc. A partir daí será preciso trabalhar na
instalação de equipamentos, sistemas de segurança e no acabamento.
Acreditamos que em 2010 o novo prédio estará operacional", disse Puntoni.

A parte do prédio onde ficará o IEB, no entanto, deverá levar
aproximadamente mais dois anos para ser finalizada. "A parte da construção
voltada à coleção Mindlin foi privilegiada, para podermos trazer logo o
acervo. Precisaremos ainda levantar recursos para a finalização da outra
parte", disse.

Integração digital

Segundo Jancsó, a concepção básica do projeto Brasiliana USP parte da ideia
de criar uma estrutura de conservação de uma parcela do patrimônio cultural
da nação, que é a Biblioteca Guita e José Mindlin.

"A partir daí, poderemos investir na conservação do extraordinário acervo
documental guardado pela USP. A universidade tem, em suas bibliotecas, cerca
de 6,5 milhões de livros. Tudo isso hoje está à disposição dos interessados
quase que exclusivamente mediante acesso presencial", disse.

A ideia do projeto, segundo Jancsó, é contribuir para a conservação de todo
o acervo da USP por meio da constituição de um centro de formação de
restauradores que levará o nome de Guita Mindlin - a esposa de José Mindlin,
morta em 2006 aos 89 anos, pioneira nas ações de restauro de livros e
documentos no Brasil.

"Por outro lado, é papel da universidade pública fazer com que a visão
patrimonial seja superada e fazer com que esse acervo custodiado pela USP
possa estar ao alcance, de modo universal e irrestrito, a todos os
brasileiros interessados", afirmou.

De acordo com Jancsó, os acervos do IEB e da Biblioteca Guita e José Mindlin
são complementares e, juntos, deverão formar a principal coleção existente
de livros e documentos voltados aos estudos brasileiros. "A construção desse
prédio no centro da USP resgata a ideia de que essa universidade foi criada
para pensar o Brasil", disse.

Jancsó conta que a USP investiu R$ 15 milhões para a construção do novo
prédio e o projeto captou mais R$ 18 milhões junto a fundações e recursos
provenientes de mecanismos de renúncia fiscal. Já os recursos da Brasiliana
Digital foram integralmente fornecidos pela FAPESP. "Agora, conseguimos
autorização para captar mais R$ 11 milhoes pela lei Rouanet, para finalizar
a obra. E vamos ter que buscar mais recursos. A obra é do tamanho do
projeto", destacou.

O site Brasiliana USP reúne informações sobre o projeto, sobre a Biblioteca
Brasiliana Guita e José Mindlin e Brasiliana Digital, com destaques como o
primeiro livro impresso no Brasil (A Relação da Entrada[...], por Antonio
Isidoro da Fonseca), cenas da vida urbana de Jean-Baptiste Debret
(1768-1848) e o relato do marinheiro Hans Staden (1525-1579), de 1557.

"A edição de 1557 de Marpurg é a verdadeira primeira edição da obra de Hans
Staden. Comprei-a encadernada com mais três livros (Varthema, Federman e um
romance de cavalaria alemão), numa encadernação de 1558. A biblioteca possui
também uma edição pirata de Frankfurt, provavelmente do mesmo ano, que, não
dispondo das matrizes da primeira edição, foi ilustrada com gravuras da
viagem de Varthema ao Oriente, sem qualquer relação com o Brasil e com os
índios", disse Mindlin.

Brasiliana Digital: www.brasiliana.usp.br/bbd.